Um ano após a morte do menino Eduardo de Jesus Ferreira, sua mãe, Therezinha, se divide entre a força para lutar por justiça e a dor da perda do filho, que tinha apenas 10 anos. Em 2016, a piauiense que mora no Rio de Janeiro viajou com a Anistia Internacional para a Suiça, Espanha, Inglaterra e Holanda para falar sobre a violência nas favelas brasileiras.
"Me entristece, porque nunca imaginaria sair do país, principalmente por causa da morte do meu filho. Como Deus me escolheu para lutar por justiça pelo meu filho, eu fui. Eu vou ser a voz do Eduardo. Mas é uma ferida que nunca vai cicatrizar", avalia.
Therezinha relembrou o dia da morte de Eduardo e voltou a afirmar que não houve confronto entre traficantes e policiais no momento em que o filho foi atingido, ao contrário do que dizem os policiais militares envolvidos e a Polícia Civil, responsável pelas investigações.
"Não havia nenhum tiroteio naquela hora, não ouvi nada. Lembro é dos policiais falando pra mim e para minha filha, quando ela tentou tirar a máscara de um deles: 'A gente vai voltar'. Não me sinto segura no Rio, por isso fui para o Piauí", relata Therezinha.
Investigação
A Polícia Civil, no inquérito conduzido pela Divisão de Homicídios, não indiciou nenhum dos dois policiais que admitiram ter atirado com fuzis pouco antes de Eduardo ser atingido. Em depoimento, um deles alegou que havia um confronto com criminosos no momento em que o menino foi baleado.
A irmã de Eduardo, Patrícia Ferreira de Jesus, no entanto, garantiu à Polícia Civil que não ouviu tiros disparados por criminosos antes de o irmão ser atingido. Estojos de munição calibre .40 foram coletados pela DH próximo ao local do crime.
Segundo o relatório de conclusão da investigação, escrito pelo então delegado Alexandre Herdy, atualmente na Draco, o laudo de confronto de balística indica que o estojo calibre .762, pego no local do crime pelo pai de Eduardo, "foi degflagrado pela arma de fogo de número de série Aha 04145, utilizado pelo policial militar Rafael de Freitas Monteiro Rodrigues".
Em outro trecho do texto, no entanto, Herdy afirma que os atos de investigação "não foram suficientes para se determinar, com precisão, quem foi o atuor específico do único disparo de arma de fogo que vitimou Eduardo". Na conclusão, o delegado destacou que os policiais militares mais próximos do menino, ambos da UPP do Alemão, "efetuaram, no total, três disparos de arma de fogo contra marginais armados, vindo, por erro na execução, a atingirem o menor Eduardo de Jesus Ferreira..".
Denúncia e audiência
Em novembro de 2015, o promotor Homero das Neves Freitas Filho contestou a conclusão da Polícia Civil sobre o caso, e denunciou o PM Rafael de Freitas Monteiro Rodrigues por homicídio com dolo eventual.
Segundo o promotor, "o policial militar atirou a esmo, sem que tivesse ocorrido comprovadamente qualquer agressão atual ou iminente", disparando tiros de fuzil calibre .762, "assumindo o risco de produzir resultado morte".
"Só vou sossegar o meu coração quando eu vir esse policial julgado, condenado e preso. Sem isso, não posso cuidar da minha vida própria, de nada ao meu redor. Só posso lutar por justiça", ressaltou Therezinha.
A denúncia foi aceita pela 4ª Vara Criminal no final do mês. Após uma audiência preliminar, a primeira audiência foi marcada para o dia 4 de julho de 2016, às 15h. Entre as testemunhas arroladas pela defesa do PM, estão o chefe da Divisão de Homicídios, Rivaldo Barbosa, e o delegado que comandou as investigações do caso, Alexandre Herdy. Outros seis policiais que estiveram na operação que resultou na morte do menino também serão chamados.
Procurada, a defesa do PM Rafael não atendeu. A Coordenadoria de Polícia Pacificadora, em nota, afirmou que o policial segue à disposição da corporação. Um protesto em homenagem a Eduardo está marcado para as 9h deste sábado (2), com uma caminhada até o local onde o menino de 10 anos morreu. Às 14h, será exibido no cinema do Alemão, na Nova Brasília, o documentário " O outro lado do cartão postal", que relata a visão dos moradores sobre as mortes de Elizabeth e Eduardo e a violência na região.
Fonte: G1 Rio